11 de ago. de 2018

"Aconteceu no último sábado"...



"Aconteceu no último sábado"...

      Existem pequenas coisas que acontecem na vida da gente que merecem observação especial. Creio que elas não acontecem por acaso, ocorrem por algum motivo, ainda que seja para que façamos uma reflexão sobre nossas próprias condutas ou posturas. No último sábado, após ter almoçado na casa da minha mãe, resolvi que faria um percurso ciclístico mais extenso, aproveitando o tempo nublado e a temperatura agradável que fazia naquele dia. Planejei ir até à famosa "ponte caída", distante uns dezoito quilômetros do trevo principal de Presidente Venceslau, através da vicinal SPV-20, para dar uma olhada breve no Rio Santo AnastácioDepois de uma contemplação de uns dez minutos, voltaria para casa.

      Tudo o que eu levei como precaução foi um aparelho celular, para alguma "emergência". Nada de câmara de ar reserva, bomba para encher pneu, nada. Fui pedalando sem lenço sem documento, num céu nublado de agosto. Ritmo tranquilo, apreciando a paisagem, me exercitando e meditando. Sim, medito. É olhando a natureza que eu me sinto mais perto de Deus, no silêncio de uma estrada em que poucas pessoas transitam. Chegando lá, havia uns três, quatro carros, de pessoas que estavam pescando na beira do rio. Bati um papo com dois pescadores, coisa rápida, só para fazer alguns registros fotográficos e voltar em seguida.

      E aí, iniciei o retorno. Uns dois quilômetros, no máximo, e eu ouço um barulho: Pssiiiii! Olhei para o lado, para o céu, e não vi nada. Foi quando resolvi olhar para o pneu dianteiro... furado! Toda a meditação foi para a roça, o monge budista havia, em dois minutos, se transformado no Incrível Hulk, de tanta ira. Que baita enrascada!

       Volto empurrando a bicicleta e pensando no que eu iria fazer, pois eu tinha compromisso às dezessete horas, e caminhando, não iria honrá-lo nunca. Um quilômetro de caminhada, e eu tentei passar uma mensagem através do celular. Nada. Em cada quilômetro, mais uma tentativa de fazer contato, e novamente, nada. Foram cinco quilômetros e cinco tentativas frustradas. O céu começava a precipitar algumas gotas finas de garoa, só para "melhorar" um pouco a situação. Pedir carona não estava nos meus planos, porque eu sou mais desconfiado que mineiro fechando negócio. Tá, orgulhoso, admito. Ouço uma caminhonete, olho para a trás, mas não sinalizo pedido de ajuda. Passou por mim feito um foguete de rodas. Quatro cachorros chatos vieram no meu encalço, latindo só para cumprir tabela, porque não impunham respeito nem a um gato moribundo. Uns quinhentos metros depois, pararam de me encher o saco. Passou por mim um senhor, também ciclista, que lamentou o ocorrido, mas que pouco poderia fazer, pois a câmara de ar reserva de sua bicicleta não era compatível com a minha. Seguiu adiante, mas valeu sua intenção.

     Sigo, pensando no que iria fazer. Ouço outra caminhonete. Era a oportunidade de colocar o orgulho e a teimosia de lado, não pela caminhada que teria pela frente, mas para honrar o compromisso e não preocupar desnecessariamente algumas pessoas que não sabiam sequer onde eu estava. Sinalizei pedido de ajuda. Uns dez metros depois, o condutor da caminhonete parou solícito, emendando a pergunta:
         - O que aconteceu?
     - Furou o pneu da bicicleta, se o senhor puder me deixar pelo menos até no trevo de "Venceslau", eu agradeço!
       O senhor de óculos, aparentando mais ou menos uns sessenta e poucos anos, desceu e amarramos a bicicleta na carroceria do veículo. E aí, veio a outra preocupação: conversar com um desconhecido, pois eu sou ruim pra caramba na condução de diálogos com quem nunca tive contato. Com pessoas conhecidas tudo flui muito bem. Mas para iniciar uma amizade, sou uma lástima. Mas qual! O senhor conduziu o papo com grande simpatia, e falamos, em poucos quilômetros, sobre vários assuntos: cidade, emprego, família e comportamento humano.

     Disse-me que era empresário na cidade, falou sobre as dificuldades que enfrentava com os encargos, coisa e tal. E depois, falou sobre conduta, honestidade, religião. Fez uma comparação didática sobre o manual do veículo e o nosso "Livro Sagrado", na busca da salvação da alma. Eu, que não sou muito religioso, admito ter ficado admirado com o discernimento e a sabedoria com que ele fez sua explicação, mostrando a Bíblia em uma das mãos. Chegando no trevo, descemos a bicicleta da carroceria, para só então, perguntarmos os nomes um do outro. E foi assim que tudo o que tinha para ser uma grande enrascada se transformou naquelas pequenas lições de vida, que envolvem generosidade e gratidão. Talvez este senhor nem saiba do meu agradecimento em forma de texto, mas isso não importa. Se o exemplo que ele deu contagiar os que fizeram esta leitura, já está de bom tamanho. Aconteceu no último sábado...

* O Eldoradense

3 comentários:

  1. Muito bom essa reflexão.

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  2. Que bom poder tirar de alguns infortúnios aprendizados para a vida toda... ótimo texto, tomara que o senhor que o ajudou possa ler!!!
    Abraços!!!

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