27 de ago. de 2019

Conto: "A sereia da orla" - Parte ll





   Igor esfregou os olhos com as costas das mãos. Fez isso uma, duas, três vezes! E lá estava a bela sereia cantando uma música que, ao seu entender, não era tão bela assim. Olhou para o lado, tentando visualizar alguém filmando. Sim, pois assim como ele pregou uma peça nos policiais, alguém poderia estar tirando uma onda na sua cara. Nada. Além dele, só a sereia, a lua e a água....

     - Dona sereia, não é por nada não, mas isso é alguma armação, né?
         
         - Você não acredita em sereias não?

     - Olha, já é difícil acreditar em uma mulher-peixe, e cantando este tipo de música, é mais inacreditável ainda!

       - E você quer que eu cante o quê?

      - Dá pra arriscar uma da Zélia Duncan, da Ana Carolina, ou quiçá, Marisa Monte?

      - Ah, isso é para as minhas primas lá do litoral! Eu sou do interior, é isso é o que eu tenho pra hoje!

        - Tá ok! Eu vou voltar pra casa, porque isso tá muito estranho...

         Despeitada com a rejeição, a Iara epitaciana começou a cantar ainda mais alto...

         "Iêe, infiel...

          ... Eu quero ver você morar, num motel!"

        Igor ficou perturbado. Colocou as mãos nos ouvidos num gesto de desespero, e, sem saber o que estava fazendo, foi em direção ao lago, numa tentativa de fazer com que a sereia parasse de cantar sofrência. Tornou-se presa fácil da mulher-peixe. Ela o abraçou vingativa, e mergulhou com o rapaz nas profundezas. De resto, é aquilo que a gente já sabe. O rosto do rapaz estava estampado na primeira página da Folha Ribeirinha...

        Naquela casa simples na Vila Maria, João Tilápia fala para Zé Tarrafa, com um exemplar do jornal nas mãos...

         "Isso foi coisa da sereia da orla! A gente deveria falar sobre ela para as autoridades!"

        Em um bar no centro da cidade, dois policiais militares de folga jogam sinuca, enquanto um fala para o outro...

        "Tá vendo!? Eu sabia que aquele moleque desaforado não estava fumando só orégano!"

         Enquanto isso, nas profundezas do lago, uma sereia chorava vingativa, após ter cometido um crime passional, ao mesmo tempo que pensava...

           "Se tivesse correspondido ao meu amor e ouvisse com um pouquinho mais de carinho o meu repertório, teria sobrevivido!"


* O Eldoradense

       

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