Às vezes nos deparamos com histórias tão malucas que são inacreditáveis. O que vou escrever logo abaixo, é baseado em fatos reais, desde que a pessoa que contou sua narrativa esteja dizendo a verdade. Digamos então, que seja uma história baseada em fatos "supostamente reais". Acho que assim fica melhor.
Início da noite de segunda-feira, e eu começo mais um expediente de doze horas de trabalho. Toca o telefone, e o diretor de turno me disse que eu deveria prestar serviço de escolta na Santa Casa local. Não é uma das notícias mais agradáveis de se ouvir, mas enfim, ossos do ofício.
Quando chego no hospital, um amigo de trabalho já estava por lá. Formaríamos a dupla de vigilantes que seria acompanhada por outra dupla, porém, de militares. Até aí, tudo ok, a vigilância cuida do normal, como diria a música do Zé Ramalho.
Eis que dois quartos à esquerda do qual vigiávamos, sai um adolescente falante, com trajes de mochileiro e perfil saltimbanco. Sim, parecia aqueles sujeitos que trabalham em circos ou parques de diversões. Falava um bom portunhol, e era extremamente simpático. Uma das enfermeiras nos disse sua história: O rapaz, que dizia se chamar Orlando, é de origem mexicana, e após uma convulsão na beira da rodovia, foi socorrido pela ambulância da concessionária, que o trouxe até à Santa Casa.
O policial, então, desconfiado por vocação profissional, chama o rapaz e começa a entrevistá-lo sutilmente, com um portunhol também fluente. Orlando repete a história contada pela moça, acrescentando alguns detalhes tão misteriosos quanto surpreendentes...
O jovem é um refugiado mexicano que tentava a travessia para os Estados Unidos, portando somente a roupa do corpo e mil dólares. Ao tentar chegar ao primeiro mundo, foi abordado pelos policiais americanos de fronteira, que não o deportaram. Em troca dos mil dólares, fizeram vista grossa para o delito do rapaz, desde que ele voltasse com as próprias pernas, sem deportação. Explico: Se fosse deportado, Orlando nunca mais poderia pisar os pés em território estadunidense, nem na condição de turista. Então, policiais corruptos e refugiado fizeram um acordo teoricamente bom para as duas partes.
E é aí que vem o trecho mais esquisito da história. Ao invés de voltar pra casa, como deveria ser, o jovem começou uma peregrinação rumo ao sul, atravessando toda a América Central, chegando então, à suspeitabilíssima Ponta Porã. Esta verdadeira diáspora latino-americana teria sido feita alternando caminhadas e caronas. Depois, lá veio o rapaz voltando ao norte, sentido contrário, onde teve a tal convulsão no acostamento da rodovia Raposo Tavares. Foi então que a viatura da concessionária que presta serviços na estrada socorreu Orlando, que foi internado na Santa Casa de Presidente Venceslau.
O policial disse que era preciso entrar em contato com a Polícia Federal e o consulado do México, para viabilizar o regresso do rapaz. Uma enfermeira disse que os trâmites já haviam sido feitos pela serviço de assistência social do hospital. Orlando disse que havia telefonado à mãe, mas falou que encontrava-se em Guadalajara, pois se dissesse à genitora que estava no Brasil, a mesma poderia ter um infarto, pois era cardíaca. Demos risada, mesmo que perplexos com a maluquice.
O mexicano voltou ao leito hospitalar depois do interrogatório informal. Por volta das vinte e três horas, ouviu-se alguém cantar uma ópera com surpreendente eloquência. De onde vinha o som do tenor? Sim, do quarto de Orlando. As enfermeiras foram lá para pedir silêncio, mas novamente, algumas pessoas voltaram a conversar com o rapaz, que era uma figuraça. Vítima de tráfico humano? "Mula" a serviço de outro tipo de tráfico? Quem sabe? Só sei que esta é a história de Orlando. Uma história baseada em fatos "supostamente reais"...
* O Eldoradense
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