14 de mai. de 2020

Conto: "De baixo para cima"


  



      As notícias do início do ano não eram das melhores para Ribamar. Garçom em um restaurante de médio porte situado na periferia de uma cidade do interior de São Paulo, o migrante nordestino estava vendo seu emprego ruir por conta da pandemia do Coronavírus. Alguns dos seus colegas conseguiram adaptar-se à nova realidade, realizando os deliverys com suas motocicletas para o próprio lugar onde trabalhavam. Porém, os planos do jovem alagoano era conseguir a habilitação ainda no fim do ano. Havia cinco dias que estava demitido temporariamente, com a promessa de regresso quando tudo "voltasse aos eixos". Sim, esta foi a expressão usada pelo patrão com semblante contrariado, mas sem muitas alternativas para outras soluções.

    Em casa, no fim de mais um dia de dúvidas, aflição e desesperança, sentou-se ao lado da escrivaninha que ficava encostada à janela. Soprava um vento diferente, daqueles que serviam para dar boas vindas ao inverno. Sobre o móvel, encontravam-se boletos de água, luz, cartão de crédito. Olhou para o céu e clamou em pensamento por um sinal divino, algo que viesse de cima para baixo, em forma de acalento. Pensativo, questionou a existência de Deus e concluiu o quanto era insignificante: sentiu-se do tamanho de um vírus diante da imensidão do universo. Olhou o céu por mais cinco minutos, aguardando o sinal. Nada. A esposa, cansada dos serviços domésticos, cochilava no sofá.

   E aí, rompendo sua meditação pessimista, uma voz infantil balbuciou palavras incompreensíveis, e duas mãozinhas pequeninas escalaram sua canela até os joelhos, almejando seu colo. Foi então que percebeu o quanto era importante, e nos olhos do filho, não teve dúvidas quanto à existência do Criador. O sinal que tanto pediu, não veio de cima para baixo, mas no sentido inverso, exatamente para mostrar sua relevância. Abraçou o guri e o beijou na testa. Amanhã há de ser um dia melhor... Com fé em Deus!

* O Eldoradense

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