10 de abr. de 2022

Conto: "O blefe de trás do gol"


 

   O fato aconteceu na imagem que você vê na postagem. Atrás deste gol, no campinho do Eldorado, bairro de Presidente Venceslau que tem até bandeira própria, onde as coisas mais estranhas acontecem. Sei que você talvez possa não acreditar no causo, mas é tudo verdade. Ou talvez, quase tudo. Mas se quiser confirmar, pergunte pro Nélio, meu irmão.

   Era um domingo ensolarado de manhã, mais um daqueles em que o time dos casados enfrentava o dos solteiros no minicampo do bairro. As regras do acanhado campinho estipulavam oito atletas para cada lado, totalizando dezesseis jogadores. Mas, em nome da inclusão esportiva, deveria ter uns quinze pra cada lado. Eu, meu irmão e mais uns cinco jogadores queríamos uma "beira" na peleja, mas chegamos atrasados. Afinal, onde cabem trinta, poderiam caber trinta e cinco! Mas naquele dia não teve jeito, o negócio era ficar conversando atrás do gol e cornetando aquele bando de pernas de pau. 

     A molecada do time dos solteiros mais uma vez estava encurralando os casados barrigudos de meia idade. Quatorze jogadores solteiros no campo de ataque, quinze casados se defendendo de forma desarticulada, um vexame. O décimo gol era questão de tempo, e o goleiro solteiro, isolado num dos lados do campo conversava conosco, sem ter nada que fazer. Dava até pro arqueiro jogar uma partida de truco com a gente, se fosse o caso!

     Eis que das bandas do Jardim Coroados, desce um forasteiro até então nunca visto. Sujeito alto, magrelo, gingado exótico, camiseta nos ombros. Parou atrás do gol e começou a conversar conosco, do nada...

    Bom dia. Que altura vocês acham que tem este gol?

    Um dos moleques respondeu:

   Sei lá, uns dois metros e meio, eu acho. Por quê?

  Eu salto por riba dele, faço muito isso. Quer casar cem contos que pulo, só de bater a mão sobre o travessão?

   Ninguém tinha grana, mas muita curiosidade. O moleque, então, respondeu...

  Tô sem dinheiro aqui, mas se caso você pular, busco lá em casa. É umas duas quadras lá pra baixo...

   Ok, mas antes, eu preciso me aquecer....

  O sujeito então fez uma aquecimento bastante pitoresco. Em pé, passou uma das pernas por trás do próprio pescoço e começou a saltitar com a outra, como se fosse um saci não amputado. Depois, alternou a perna com que saltava, deixando a outra por trás do pescoço. Cena surreal, surpreendente, que demonstrava algum preparo físico.

    O moleque, desafiador, com medo do que viu, disse:

    Tio, deixa quieto esta aposta aí!

    Não nego que todos nós ficamos de queixo caído. Se aquilo foi um blefe ou se o salto realmente seria realizado, ninguém sabe. Só sei que o cara resmungou alguma coisa e saiu frustrado, como quem deixara de ganhar dinheiro fácil. Não sei se o forasteiro era cigano, capoeirista ou contorcionista, mas é fato que nunca mais fora visto na cidade. Ficamos todos boquiabertos e curiosos para saber qual seria o desfecho do desafio, se levado adiante.

       Do outro lado do campo, os solteiros finalmente marcavam o décimo gol, no trigésimo minuto do primeiro tempo. Mas naquele dia, quem roubou mesmo a cena foi o misterioso forasteiro...

* O Eldoradense

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