30 de nov. de 2023

Comentário: "O Botafogo merecia uma tese de psicologia!"

 




    "Tem coisas que só acontecem com o Botafogo". Quem acompanha futebol, já ouviu a frase, que originalmente falando, segundo pesquisadores, é: "Há coisas que só acontecem com o Vasco e o Botafogo". Dizem que a frase ganhou força porque Vasco e Botafogo, até meados da década de 40, fizessem o que fizessem, não conseguiam ganhar o campeonato carioca. Porém, os cruz maltinos ganharam o primeiro título, e aí, a máxima caiu no colo do clube da estrela solitária. Logicamente o Botafogo também conseguiu seus títulos posteriormente, mas aí, já era: O dito popular já estava impregnado no uniforme botafoguense, bem como no inconsciente coletivo dos folclóricos e irrreverentes torcedores cariocas.

      E "nunca na história do principal campeonato futebolístico deste país", uma frase fez tanto sentido, teve  tanto nexo. O Botafogo finalizou o primeiro turno do Campeonato brasileiro treze pontos a frente do segundo colocado. E, por mais que treze seja um número agourento - exceto para Zagalo, ídolo do Bota - nem mesmo  o botafoguense mais pessimista ou até mesmo o torcedor adversário mais otimista imaginaria tantos revezes que culminariam na perda do título pelos alvinegros de General Severiano. Goleando Palmeiras e Grêmio, o Botafogo inexplicavelmente permitiu duas viradas pra lá de improváveis. Diante do Santos, cedeu a um empate quando as cortinas já estavam se fechando. E ontem, diante do já rebaixado Coritiba, cedeu um novo empate, tendo aberto o placar no que se pensaria ser o último minuto de jogo. Mas não era, havia tempo para os paranaenses igualarem o marcador.

     Azar? Praga da frase mítica que acompanha o clube desde meados do século passado? Não creio. O fenômeno envolve ciência, não superstição. Se o futebol é um esporte praticado com as pernas e a cabeça, está aí a explicação lógica, ao meu ver.

       Primeiro, falemos das pernas: Pode ser que por ter um elenco limitado tecnicamente e com peças numéricas de reposição também limitadas, o Botafogo sucumbiu. Deu cãimbras, cambaleou, cansou. E aí,  a questão envolve também uma falha na preparação física, talvez. E, sobre o fator "cabeça", faltou também um trabalho de "fortalecimento psicológico", tão comum hoje no mundo esportivo. As "crenças limitantes", enervaram os jogadores, que na "Hora h", no "dia D", entregam a rapadura. Tensão psicológica, que faz tremer pernas supostamente já cansadas. Aí não dá outra: O goleiro botafoguense pega a bola no fundo da rede, olha para o relógio, o juiz finaliza o jogo e o temor pelo próximo insucesso vira uma bola de neve. 

       O "Tem coisas que só acontecem com o Botafogo" deste ano merecia uma tese de psicologia: Lembram daquele personagem humorístico vivenciado pelo saudoso Brandão Filho, o "Sandoval Quaresma", da Escolinha do Professor Raimundo? Acertava todas as perguntas, e na última, a que valia o 10, tremia na base e lamentava o insucesso com o bordão: "Tava indo tão bem!"

      Isso vale como lição de vida, como estímulo ao ser descrente no próprio sucesso, que atribui tudo apenas ao azar, ao vitimismo. Não! Diante das adversidades, preparem-se, treinem, planejem. Se mesmo assim as coisas não fluírem, busque terapia, aconselhamento,  mas não "fortaleçam as próprias fraquezas". As "crenças limitantes" assemelham-se ao elefante preso por um cipó que não sabe a força que tem. A propósito, aprendi isso na terapia. Superdimensionar psicologicamente as adversidades têm um efeito concreto devastador, e isso pode ser trabalhado.  


* O Eldoradense

21 de nov. de 2023

Argentina: O que esperar de Milei?

 




  Urnas apuradas nas eleições argentinas, e o país, sob forte crise econômica, elegeu Javier Milei com 56% dos votos válidos. A propósito, e diga-se de passagem, o presidente eleito com a maior votação da história do país platino. Simpatizantes da ultradireira brasileira comemoraram o resultado como se fosse um alento à derrota das últimas eleições brazucas. É como se um pouco do excelente doce de leite portenho mitigasse o amargor do jiló com tamanho de nabo experimentado por eles nas nossas eleições, em 2022. 

   Surrealismos e devaneios patrióticos à parte, quem analisa o quadro com frieza, sabe que este segundo turno das eleições argentinas foi marcado por um verdadeiro "mato sem cachorro":  Era o atual ministro da economia representando um modelo fracassado contra uma incógnita que vê a privatização de tudo o que for possível, a dolarização da economia e a extinção do Banco Central como solução.

     Sinceramente, não sei se Milei é mesmo o cara da campanha, ou se tudo aquilo foi uma bravata midiática eleitoreira e oportunista. E, de verdade, torço para a segunda opção, pois se ele colocar tudo o que disse em prática, a Argentina passará da situação cambaleante proporcionada pelo Peronismo esquerdista à letargia plena, ao estado vegetativo subsequente à ausência de Estado!

    Explico: Se eu fosse um cidadão argentino, seria muita alucinação da minha parte torcer por uma vitória de Sérgio Massa sendo que o mesmo foi um dos responsáveis por levar o país a uma inflação de 138% ao ano. Porém,  se eu portar o mínimo de senso crítico, também não posso acreditar que dolarizar a economia e privatizar o máximo possível de serviços públicos vá melhorar minha qualidade de vida, ainda mais numa situação tão emergencial.

      O Peronismo precisava ser derrotado, porém, não por um candidato que apresentasse soluções que irão piorar a situação do país, ao meu ver. A Argentina é uma nação de exportações do setor primário da economia, cuja paridade cambial não é interessante. Outro setor que seria afetado de cara pela possível paridade, é o turismo: Hoje, muitas pessoas que estão visitando a nação portenha são atraídas, exatamente, pelo fator cambial.

       Se a desvalorização do peso é ruim, a paridade é ainda pior. Sim, é preciso "calibrar" a moeda, diminuindo a desvalorização, mas não fazendo uma paridade artificial. Extinguir o Banco Central é outra aberração. Privatizar serviços? Como um povo que está lutando para sobreviver vai abrir mão dos serviços públicos para pagar por eles? Não faz o minimo sentido. E o fim das relações econômicas com o Brasil e a China, dois dos maiores parceiros do país, motivado por questões político-ideológicas? Ridículo! Caro leitor, seja sincero: Quem vocês acham que seriam os maiores prejudicados num possível rompimento? A Argentina ou a a dupla de parceiros?

    Torço para os argentinos e respeito a decisão por eles tomada, pois a democracia deve ser soberana. E, dentro desta linha de raciocínio, espero que Milei tenha sido apenas um personagem de campanha, e, na prática, seja mais diplomático, equilibrado e pragmático. Caso contrário, se ele for mesmo o "cara da campanha, "don't Cry for me, Argentina", como diz a letra da música de Madonna. 

      E, de verdade, acho que verei um Milei mais pragmático que valentão. Digo isso baseado no episódio que envolveu o presidente eleito e o Papa Francisco: Para quem não sabe, Milei, em campanha, chamou o Sumo Pontífice de "representação do maligno na Terra" e "comunista", o que causou mal estar entre ambos, obviamente. Porém, após a vitória, eis que Francisco telefonou para Milei, felicitando-o pelo triunfo. A resposta foi simplesmente esta: "Não tenho problemas em me desculpar com o Papa, e ele está convidado para me visitar na Argentina". 

    É isso: Se o Milei for o cara da campanha, esquece, adiós! Porém, se ele for mais racional, diplomático e pragmático, pode ser que tenha sucesso em seus objetivos, mesmo com minoria no Congresso. Sobre as comparações que envolvem o argentino eleito e o seu similar brazuca derrotado, penso que elas se aproximam nas bravatas, mas se distanciam no preparo: Milei é economista, e o daqui, um militar paraquedista aposentado precocemente para produzir quase nada no Congresso Nacional. O de lá leva vantagem no quesito preparo, ainda que a referência comparativa tenha sido nivelada por baixo.

     Finalizo dizendo que hoje tem Argentina x Brasil no Maracanã, e ainda que eu torça por uma "zebraça" com listras verde-amarelas, acho que Los Hermanos vencerão...


     * O Eldoradense 


    


      


     

   

  

17 de nov. de 2023

Causo: "Saia justa"

 



   Antes de tudo, deixo claro que o "causo" relatado nos próximos parágrafos nada tem a ver com tendêndias da moda feminina para o verão que se avizinha. "Saia justa" tem mais a ver com o sentido figurado - e não com algum figurino - no qual o termo conotativo quer dizer constrangimento.

   Tenho um amigo que considero um irmão. Sempre que podemos, marcamos uma caminhada para colocar a conversa em dia e dar umas risadas. E é fato que geralmente começamos uma discussão no trajeto, até para que a atividade fique mais motivadora, sendo que o assunto predominante nestas contendas é o bom e velho esporte bretão, o futebol. Discussões acaloradas, com tom de voz um pouco acima do normal e muita gesticulação, feito dois idosos italianos. É engraçado e um pouco ridículo, mas é legal.

     Falávamos sobre o campeonato brasileiro e ele começou a questionar uma máxima provocativa que mantenho nas redes socais: "Time grande não cai". É uma alusão que faço ao fato de que meu Santos nunca disputou série B, e de quebra, uma provocação humorada aos corintianos e palmeirenses. Não vou citar nomes por uma questão de ética, mas este meu amigo torce para o verdão.

      Seguiu dizendo que o Santos é um time médio, com torcida inexpressiva, que se fosse grande, não estaria brigando para não ser rebaixado. Eu contra-argumentei dizendo que os critérios sobre a grandeza de um clube envolvem, além de torcida, história e títulos. Também disse que seis milhões de pessoas é gente pra caramba, ainda que Corinthias, Flamengo e o próprio Palmeiras tenham bem mais simpatizantes. Concluí dizendo que dentro dos meus critérios, apesar de santista, considero o São Paulo Futebol Clube o maior dentre os brasileiros.

       Na sua tréplica ele me disse: "Na verdade, o São Paulo nem é grande, pois se ganhar algo, ninguém liga, a não ser alguns torcedores dos rivais paulistas. Se for analisar mesmo, grandes, no Brasil, só Corinthians e Flamengo. E o seu Santos é apenas um time médio".

     Alguns minutos se passaram e deixamos a discussão, mas continuamos falando sobre futebol, mais precisamente sobre um documentário que ele assistiu sobre o ex-goleiro colombiano, o lendário René Higuita. Porém, é um pouco mais adiante que a história ganha tom hilário...

    Numa rua do Eldorado, já finalizando o percurso, vinha em direção oposta à nossa um senhor com a camisa do São Paulo  portando duas sacolas nas mãos. Observei, e dentro do meu íntimo, não vi potencial ofensivo algum no sujeito em questão. Foi quando veio a brilhante idéia de interromper a fala do meu amigo palmeirense sobre o documentário, dizendo em voz um pouco mais alta:

    Desculpa, só pra recapitular: Quer dizer que, na sua opinião, o São Paulo também não é grande??

  Juro: A intenção foi apenas deixá-lo numa "saia justa", mas a reação do amigo palmeirense foi surpreendente. Deixou-me para trás num trote de uns trinta metros, dobrou a esquina assustado, e só depois de notar que não houve contestação do torcedor são paulino, olhou para trás e me esperou, ofegante e pálido. Posteriormente, emendou: "Caramba, você é mesmo um FDP, hein?

     Diante da reação medrosa e cômica, dei muita risada. A feição assustada do amigo palmeirense foi impagável. Se o episódio tivesse sido filmado, pareceria aquelas "Pegadinhas de internet". A diferença é que o senhor são paulino pouco se importou com a discussão de dois fanfarrões.

      E para finalizar, depois de refeito do susto, o amigo palmeirense respondeu: "O São Paulo não é grande mesmo não!"


* O Eldoradense

     

7 de nov. de 2023

Conto: "Iniciativa privada"

 



   Romildo era jardineiro na pequena e próspera Mitolândia, cidade recentemente emancipada do interior paulista. A cidade até então era distrito de uma outra, um pouco maior, mas o sentimento de independência ganhou força após a descoberta de inúmeras reservas minerais de nióbio em seus domínios territoriais. E economia do lugar deu um salto exponencial, com a instalação de indústrias de extração e beneficiamento do metal, gerando empregos e qualidade de vida para a população.

    O protagonista deste conto mantinha boa relação com os "Barões do Nióbio", que moravam em seus condomínios de luxo, e volta e meia precisavam dar aquele trato em seus jardins coloridos e suntuosos. Romildo, que zelava pelas pequenas praças do lugar desde a época distrital, passou a nutrir grande admiração pelos barões, que lhe pagavam pouco pelos serviços particulares, mas sempre lhe davam panetone e vinho no final do ano. 

    A economia pujante fez com que o prefeito, que teve a campanha financiada pelos Barões do Nióbio privatizasse praticamente tudo: Terminal rodoviário, praças esportivas, balneário, Biblioteca Municipal. A exceção, até então, eram os banheiros públicos. Mas logo veio o discurso de que os mesmos estavam mal cuidados e que precisavam passar para a iniciativa privada. 

      Romildo, que cuidava das praças, via que os banheiros precisavam mesmo de melhores cuidados. Ao conversar com vários Barões do Nióbio, percebeu que realmente as privadas públicas necessitavam se tornar privadas privadas. Tornou-se um entusiasta da privataria, sempre dizendo que graças à privatização, ele e toda sua família possuía aparelhos celulares. Curiosamente, Romildo não se lembrava que a ferrovia que passava ao lado da praça central de Mitolândia foi sucateada após a terceirização da mesma. Mas afinal, os celulares encurtaram as distâncias em velocidades bem maiores que a dos trens, não é mesmo?

   Karina Helena, filha de um barão do nióbio influente em Mitolândia, logo teve a ideia de fundar uma empresa especializada na gestão de banheiros. Nasceu, rapidamente, a "KH toaletes", que venceu a licitação de forma pra lá de suspeita. Os banheiros, justiça seja feita, no começo do processo, funcionavam bem: Mediante um cartão de recarga, o usuário adentrava no toalete, digitava o serviço desejado através das teclas "1" ou "2", e sentiam-se como verdadeiros reis no trono. Ao lado dos sanitários, tomada para recarga de celulares. Caixas de som tocavam músicas relaxantes, e um odor agradável de flores do campo era exalado através de inúmeros jatos aromatizantes. Um brinco! 

   Porém, o serviço não era barato: A recarga mínima do cartão era de 20 reais, sendo que o preço para quem apertasse a "tecla 1" era 8 reais, e para a "tecla 2", 12 reais. Como cortesia, a "KH toaletes" deu uma bônus inicial de 20 reais para cada cidadão. Romildo, enquanto cuidava do jardim da praça central, resolveu estrear seus créditos: apertou as duas teclas e fez jus à sua solicitação. Sentiu-se um cidadão respeitado, que poderia enfim, urinar e defecar com dignidade na praça, (ainda pública!).

    Todavia, não fez nova recarga, pois a grana era curta. Duas semanas depois, na mesma praça central, sentiu o estômago enjoar, após comer um pão com mortadela que pareceu não lhe cair bem. Correu desesperado até a unidade da praça central da  "KH toaletes". Sacou o cartão do bolso, inseriu várias vezes no leitor magnético, e por outras várias vezes, ouviu o alto falante dizer: "Lamento, saldo insuficiente!". Um suor frio correu pelo seu rosto e outra coisa mais quente correu no fundo de suas calças. Romildo percebeu que foi uma cagada apoiar a privatização incondicional das privadas públicas. Mas a barriga já havia doído, e já era tarde...

    

    * O Eldoradense

      

Comentário: "O tio França foi uma vítima"

    Ontem à noite, em Brasília, aconteceu o que penso ser o ápice do delírio Bolsonarista: Um homem trouxe explosivos em seu próprio corpo, ...