24 de fev. de 2023

Comentário: "Ganância e tragédias"

 



  Durante a pandemia eu escrevi um texto dizendo que sob as circunstâncias extremas, afloram o que há de melhor e o que há de pior no ser humano. Enquanto muitos - e eu quero crer que a maioria - unem forças, se solidarizam e exercem o autruísmo, outro grupo tenta tirar proveito e muitas vezes lucros dos dramas alheios.

      Eis que hoje de manhã assisti uma entrevista do prefeito de São Sebastião ao portal UOL de notícias. De forma categória, ele disse que tentou realizar há dois anos uma política de relocação fundiária das famílias que moram nas encostas do bairro de Maresias. Estas famílias, obviamente por exclusão social e pressão da especulação imobiliária, subiram o morro, improvisaram instalações clandestinas de captação de água e energia elétrica, pois não possuíam recursos para habitar um espaço geográfico seguro e digno. O fenômeno acontece há mais de um século em inúmeras cidades brasileiras, mas é na faixa litorânea do país que suas consequências se fazem presentes de forma mais trágica. Entenda-se por faixa litorânea não apenas as cidades caiçaras ou capitais beira-mar, mas sim, todas as cidades geograficamente próximas ao litoral. Obviamente, as duas maiores densidades urbanas do país - São Paulo e Rio de Janeiro - estão inseridas neste contexto.

      Mas voltemos ao caso específico de São Sebastião: O prefeito da cidade tentou a relocação das famílias no bairro de Maresias para uma área no mesmo bairro onde pretenderia construir quatrocentas moradias populares. Sofreu retaliações dos mais abastados, que fizeram abaixo assinado e conseguiram a impedição temporária da construção das casas. As alegações? Desvalorização dos imóveis, entraves ambientais, sobrecarga na damanda por água potável e serviços sanitários. Empresários influentes conseguiram que a política habitacional não fosse concretizada, motivados principalmente por interesses majoritariamente financeiros.

      Gente que quer os serviços da empregada doméstica, da babá, do jardineiro, do motorista, mas que não cogita nem por uma questão humanitária tê-los como vizinhos. Que tais "colaboradores" cumpram seus expedientes e voltem para o morro de onde vieram, pois a beleza cênica dos seus respectivos mundinhos estão acima de fatores "menos relevantes". Essa mesma gente que por alienação ou cinismo, ao ver na televisão tal situação, se pergunta: "Mas por que morar num lugar tão perigoso?"

      Políticas fundiárias e ambientais não devem andar legalmente juntas por frescura, para proteger bichinhos e arvorezinhas como muitos podem pensar de forma alienada: A interação homem meio ambiente deve acontecer de forma minimamente planejada e responsável, para preservar vidas e proporcionar segurança e dignidade a todos.

       O contexto é revoltante, repugnante. Mas quando  também testemunho a notícia de que alguns comerciantes queriam vender um galão de água potável a noventa reais em meio a tragédia, como se surpreender? 

       Graças à Deus, estas pessoas não representam a maioria. Porém, seus gestos de ganância e avareza precisam ser coibidos, expurgados, tanto moralmente, quanto - e principalmente - no campo jurídico...

* O Eldoradense

            

       


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